Hipotermia em cabritos e cordeiros recém-nascidos
Define-se como hipotermia ( hipo : diminuição e termia : temperatura), a redução significativa da temperatura corporal ao nível mais baixo da média normal, que no caso dos cabritos ou cordeiros é em média 39,5 °C .
Animal |
Respiração |
Pulso p/ minuto |
Temperatura retal |
Cabrito |
15 - 18 |
115 |
38,5 a 40,5 |
Cordeiro |
12 - 15 |
80 - 100 |
38,5 a 40,5 |
Os médios ruminantes são homeotérmicos, e como tais, mantêm uma temperatura corporal constante e estável. Para manter a homotermia é preciso uma taxa metabólica máxima do cordeiro e/ou cabrito (cerca de 18 kcal/hora). É improvável que animais vivam mais que algumas horas sem que essa exigência seja atendida.
Características - A enfermidade está relacionada a fatores como:
- Subnutrição das matrizes no período de pré-parto;
- Sensibilidade ao frio, que depende diretamente da reserva animal (gordura);
- Plano estabelecido para os filhotes;
- Fornecimento de colostro pós-nascimento;
- Fatores ambientais;
- Incidência direta de chuvas e corrente de vento. Nas regiões frias, a hipotermia representa uma das principais causas de mortalidade em neonatos.
Tais fatores estão relacionados com duas características da vida fetal:
- Tamanho da placenta, através da qual são fornecidos nutrientes e o oxigênio ao feto;
- Alimentação ministrada às matrizes, o que determina a quantidade de nutrientes disponíveis.
A enfermidade apresenta sintomatologia progressiva e produz uma diminuição das funções vitais. Necessita de interferência para que a temperatura seja normalizada e os parâmetros fisiológicos normais restituídos.
Ocorrências - A hipotermia poderá acontecer nas seguintes situações:
- Animais idosos - sobretudo os que apresentam baixa escore corporal (animais muito magros), caquéticos (animais que apresentam alteração profunda no seu estado geral) e débeis (animais que apresentam fraqueza física muito acentuada, devida à alimentação insuficiente ou inadequada, carência de vitaminas ou anorexia (falta de apetite).
- Remissão de quadros febris, por convalescença às infecções.
- Debilidade neonatal.
- Anemias.
- Intoxicações.
- Icterícias.
Em todas estas situações são considerados três tipos de hipotermia:
1 - Por defervescência - quando os sintomas declinam por eliminação dos agentes pirogênicos (agentes que podem produzir febre, como um agente infeccioso);
2 - Por agravamento dos sintomas - ocorre quando há diminuição da temperatura e aumento da pulsação (ver tabela 1). Pode ocorrer por fadiga dos centros termorreguladores;
3 - Por intoxicação - ocorre quando substâncias tóxicas deprimem os centros produtores de calor.
Considera-se que uma hipotermia patológica acompanha os estados de colapso circulatório ou metabólico.
As respostas fisiológicas e bioquímicas que contribuem para o equilíbrio da termorregulação e perda de calor são complexas, porém, sabe-se que as respostas têm início quando a temperatura ambiente é inferior à temperatura crítica (até 28° C), quando o indivíduo tem que aumentar sua taxa metabólica para manter sua temperatura interna.
A temperatura crítica para neonatos é mais alta que para animais adultos. Quase todos os borregos e/ou cabritos nascidos ao ar livre sofrerão estresse por excesso de calor e frio.
Temperatura crítica de cordeiros e cabritos recém-nascidos
Idade |
Peso ao nascer |
|
3Kg 4,5kg |
1 – 6 horas |
37°C 32°C |
14 – 20 horas |
33°C 26°C |
30 – 34 horas |
31°C 22°C |
A temperatura crítica determina o aumento da produção de calor, que influencia na demanda de energia e provoca efeitos negativos sobre o apetite e conseqüentemente sobre a produtividade. A exposição ao frio reduz inicialmente o apetite. Slee observou perdas de até 5kg durante o inverno.
Sobrevivência - Os principais fatores que influenciam na sobrevivência das crias são:
- Raça - há estudos sobre a variação de temperatura corporal em cordeiros recém-nascidos de diferentes raças, pressupondo taxas diferentes de mortalidade.
- Peso ao nascer - quanto maior o peso dos fetos ao nascimento, maiores serão suas condições de sobrevivência. A superfície corporal de um cordeiro pequeno é proporcionalmente mais elevada que a de um cordeiro maior. Isto significa que - em relação ao peso corporal - um cordeiro pequeno perde calor mais rapidamente que um cordeiro maior.
Mortalidade por insuficiência térmica |
|||
Peso ao nascer |
Número de cordeiros |
Número de mortos |
Mortalidade |
1,5 a 2,0 kg |
9 |
9 |
100 % |
2,1 a 2,5 kg |
51 |
31 |
60,78 % |
2,6 a 3,0 kg |
118 |
40 |
33,89 % |
3,1 a 3,5 kg |
204 |
39 |
19,11 % |
3,6 a 4,0 kg |
193 |
21 |
10,88 % |
4,1 a 4,5 kg |
216 |
19 |
8,79 % |
4,6 a 5,0 kg |
168 |
15 |
8,92 % |
5,1 a 5,5 kg |
87 |
5 |
5,74 % |
5,6 a 6,0 kg |
52 |
2 |
3,84 % |
6,1 a 6,5 kg |
18 |
0 |
0,0 % |
Fonte: Garcia (1986)
- Umidade – ambientes úmidos predispõem os neonatos à enfermidade.
- Condições climáticas – deve-se fornecer abrigo aos recém-nascidos contra chuvas e correntes de vento.
- Alimentação das matrizes – uma alimentação deficiente no terço inicial da gestação poderá determinar o tamanho da placenta, que poderá trazer graves conseqüências ao desenvolvimento do feto. É essencial estabelecer um programa nutricional adequado às matrizes no terço final de gestação, visando ao máximo crescimento potencial dos fetos. Uma alimentação deficiente resulta em fetos pequenos e com poucas reservas energéticas. É provável que fêmeas mal alimentadas apresentem pouca ou nenhuma produção leiteira.
- Nível nutricional das pastagens.
- Habilidade materna - A sobrevivência das crias está limitada às suas condições de reservas de energia corpórea (gordura) que dependerá principalmente da nutrição pré-natal de sua mãe com cerca de 300 kcal/kg. Fêmeas submetidas à essa dieta irão parir filhotes com reserva suficiente para sobreviverem por cerca de 12 horas sob mau tempo e cerca de 3 dias sob tempo bom.
Colostro - Diretamente relacionada a estas variáveis estão a rapidez com que o filhote levanta-se e mama o colostro após o nascimento. O colostro é essencial à sobrevivência dos recém-nascidos, visto que as imunoglobulinas (IgG e IGA) ajudam na prevenção das enfermidades.
A ingestão precoce de colostro tem uma vantagem adicional para os recém-nascidos. Ele ajuda mais aqueles que apresentam boas reservas enérgicas, gerando um incremento na produção de calor de até 17%, o que aumenta sua resistência à hipotermia.
Caso a matriz não disponha de colostro ou este não seja suficiente, pode-se fornecer, se necessário, por meio de sonda gástrica, colostro artificial que consiste em:
- 2 litros de leite
- 5 ovos
- 3 colheres de destrose (mel de abelha)
- 3 colheres de farinha Láctea
- 3 colheres de leite de soja
- 3 colheres de calcigenol
Esta mistura poderá ser congelada e guardada. Deve ser fornecida aos recém-nascidos na razão de 50 ml/kg, 2 ou 3 vezes ao dia.
Fatores que influenciam - Os fatores que afetam a perda de calor podem dividir-se em fatores que dependem dos neonatos e fatores que dependem do meio-ambiente. Alexander ( 1962 ) cita que quando se expõe um recém-nascido a baixas temperaturas, a produção de calor acontece por dois mecanismos:
1 - Metabolismo da gordura corporal;
2 - Fatores ambientais.
A produção de calor deficiente tem estreita relação com a carência aguda de oxigênio, o que pode ocasionar morte prematura dos neonatos por hipoxia (carência de oxigênio). Eles permanecem letárgicos, gerando pouco calor orgânico, o que torna a hipotermia inevitável. Recém-nascidos prematuros que sofreram hipoxia no momento do seu nascimento estão especialmente predispostos a sofrer hipotermia, bem como animais procedentes de partos duplos ou triplos.
Perdas de calor orgânico por conta da inanição (fome) dos neonatos por um período superior a 6 horas causam o abaixamento dos níveis de glicose no sangue (hipoglicemia). Os principais fatores que afetam a perda de calor são a temperatura e a velocidade do vento. As matrizes podem reduzir consideravelmente as perdas de calor do recém-nascido, secando-o imediatamente após o parto e proporcionando-lhes abrigo.
Prevenção - A prevenção dá-se pela aplicação prática dos conhecimentos de manejo e pelo histórico da ocorrência de casos na região. Se a maioria dos casos apresenta-se a partir de 12 horas, é provável que a inanição seja a principal causa. Nesse caso deve-se ter cuidado com a alimentação das gestantes no terço final de gestação e logo após o parto. Por ocasião do parto, é interessante separar e dispensar maiores cuidados aos recém-nascidos, sobretudo de ovelhas débeis e/ou muito velhas.
Lesões - A hipotermia só pode ser diagnosticada tomando-se a temperatura retal dos cordeiros. Em último caso, o exame pós-morte (necropsia) poderá indicar as causas do problema (estômago vazio, pouca reserva energética, sinais de desidratação, peso corporal débil, etc.). Considera-se ligeiramente hipotérmico, o animal que apresenta temperatura entre 37°C e 39°C . É gravemente hipotérmico quando apresenta temperatura inferior a 37°C .
Tratamento - Recém-nascidos débeis que apresentarem temperatura inferior a 38°C deverão ser secos e posteriormente aquecidos e alimentados (com colostro até 12 horas após o nascimento e com leite após esse período). Se o estado de debilidade for grave, deve-se aplicar, por via intraperitonial, uma solução de glicose a 20%, na razão de 30 ml, mais antibióticos de ação prolongada por via parenteral.
Se for necessário, ministrar - via sonda gástrica - 200 ml de colostro artificial 3 vezes ao dia, até que o cabrito ou cordeiro consiga mamar por conta própria. Deve-se tomar a temperatura de hora em hora, até que a mesma se restabeleça.
Fonte: Revista O Berro nº 80